Pesquisador projeta que casos de dengue seguirão em alta em março no RS
Condições climáticas e falhas na prevenção favorecem o mosquito transmissor da doença, diz Fernando Spilki
Publicado em 18 de fevereiro de 2024
Compartilhar
A- A A+

“Já seria ruim se apenas empatássemos com os números de 2022 ou 2023: o preocupante é que a tendência é que tenhamos um ano mais difícil”. Assim começa o alerta do virologista e professor da Universidade Feevale, Fernando Spilki, sobre o avanço da epidemia de dengue no Rio Grande do Sul. Para o especialista, o Estado ainda vivenciará o crescimento do número de casos da doença durante o mês de março. “A tendência é de um ano mais difícil”, completa.

Entre os fatores, Spilki destaca as condições climáticas, que historicamente têm favorecido a proliferação do mosquito transmissor, o Aedes aegypti, e a necessidade de estratégias públicas para desacelerar a circulação do vírus.

“Esse é um processo que vem se construindo há muito tempo. A chegada do mosquito ao RS ocorre em meados dos anos 2000, mas até a coisa de três anos atrás não tínhamos todas as condições necessárias, especialmente de temperatura e de regime de chuvas, que promovem a proliferação (do inseto). Esses processos de longo prazo, somados com as questões de aquecimento e de outros extremos climáticos, favorecem enormemente a dispersão da dengue e de outras doenças transmitidas por mosquito”, enumera o pesquisador, que defende ações coletivas imediatas voltadas à prevenção.

“O combate ao mosquito exige esforço do poder público em estratégias combinadas, mas também muito esforço da população, cuidando do seu domicílio e do entorno. E sem invenções, já que medidas são adotadas de forma isolada, por vezes, até mesmo sem comprovação científica. Precisamos atuar com aquilo que já se conhece e que funciona: prevenção, mapeamento e destruição de possíveis focos”.

Conforme a Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul (SES/RS), em 2024 já foram contabilizadas 9.622 notificações, com 4.469 casos confirmados, sendo 3.982 infecções contraídas no Estado, e três mortes confirmadas. Por sua vez, o Aedes aegypti está presente em 466 dos 497 municípios gaúchos. Ainda de acordo com os números oficiais da SES/RS, a progressão de casos é registrada de forma expressiva nos últimos três anos: foram 38.244 em 2023, 67.326 em 2022 e 10.602 em 2021. Os óbitos também aumentam, com 11 em 2021, 66 em 2022 e 54 no ano passado.

Diante dos dados atuais, Spilki projeta que a chegada do outono, na segunda metade de março, será um freio importante para o avanço da doença no Rio Grande do Sul, mas não representará o fim da transmissão do vírus. “Há três anos o mosquito encontra condições de temperatura ideais para sua proliferação, e, infelizmente, esse processo vem se repetindo e provavelmente continuará. Imaginamos que a transmissão deve arrefecer em meados do outono, mas o que devemos enxergar, salvo alguma surpresa, é o estabelecimento da dengue como uma doença permanente no horizonte do Rio Grande do Sul”.

Vacina não substitui a prevenção

Fernando Spilki também coordena o Instituto Nacional de Vigilância Genômica de Vírus e Saúde Única (INCT-One), que atua no monitoramento da evolução de vírus transmitidos por mosquitos no país e promove uma gama variada de pesquisas com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à pesquisa do Estado (Fapergs). E com a experiência de quem trabalha em busca de inovações para conter doenças transmissíveis, o especialista traz um outro alerta importante: a introdução da vacina contra a dengue não pode tomar o lugar da prevenção.

“A vacina será, quando aplicada, por exemplo, no caso gaúcho, quando estiver disponível, uma ferramenta importante, adicional, mas não poderemos abandonar a principal ferramenta de prevenção, que é o combate ao mosquito, ela (imunização) controla a doença, não o vetor”, lembra.

“Uma vacina de duas doses, mesmo que conseguíssemos vacinar os adultos, uma parte muito suscetível, idosos e crianças, seguiria descoberta. E mesmo que fosse possível vacinar as crianças agora, a imunidade se estabeleceria no final ou após o que nós imaginamos ser o fim desta onda de dengue”, detalha Spilki.

O virologista lembra ainda que a imunização sem o controle populacional do Aedes aegypti, sob risco da instalação de outras doenças transmissíveis. “Quanto à questão climática, a situação não modificará tão cedo no caso gaúcho, então temos que aprender com as boas estratégias realizadas em outros estados da federação. Esta é uma conscientização importante, nós precisamos fazer o máximo para combater o mosquito neste momento, com as ferramentas que já temos e comprovadamente eficazes. Todas as vezes que nós tivemos o engajamento da população e o poder público atuante, obtivemos sucesso e reduzimos a disseminação do vírus” reforça.

 

 

Fonte: Bruna Casali / Com informações Correio do Povo
Fotos
Comentários